terça-feira, 6 de setembro de 2016

I'll Find a Way


Seiscentos segundos e uma ficha de telefone. Pedi-a para descer no térreo para ao menos abraçá-la, e dizê-la que a amo, como ninguém amaria. Talvez submerso na própria mentira de que que ela sempre soube de tudo, minhas palavras tornaram-se cianureto em minha boca e por instantes eu morri.

Aquele sorriso desconcertante ao partir sugou as últimas gotas que restavam da minha vontade de esconder o que aquela inundação de dopamina me mandava fazer. Gritei com tudo o que restava dentro de mim, para que ela pudesse ouvir. 

Não restaria nada a ser lembrado senão rasuras não lidas em guardanapos e minhas cinzas jogadas em qualquer lugar. Porém, de mesmo modo, não teria corrido de braços abertos por um erro que não valesse a pena.

Não há volta!

Em meu último suspiro percebi que meu desejo de manter aquela história em minha mente acabou por me afastar, como um revés aos meus sonhos. Quando o velho personagem encontrou um novo amor e o talvez sentado de frente para aquele mesmo olhar mal poderia esperar para o desfecho da história.

E assim tudo acabou. Um guardanapo com o resto de nossas histórias saltou de minhas mãos e tornou-se livre ao som do vento frio de uma noite de fim de inverno. 


sexta-feira, 8 de julho de 2016

A Passos Largos



Quando a vejo partir, pergunto-me incessantemente:
- Por que a pressa?

Já não sei mais qual de nós dois foge da nossa história, como se isto realmente precisasse acontecer. Mas para que tanta pressa? Tenho a impressão de que você se vai aos poucos, e que eu morro tentando fugir para evitar te perder. Mas até quando?

Preparo um bom café, sento-me em uma velha cadeira na varanda do apartamento e respiro aquele ar úmido e babélico após uma forte tempestade de um inverno que tarda a chegar. Acendo um cigarro, mesmo sabendo que não deveria fazê-lo. Confesso que, se eu fosse eu, esperaria para sempre.

Releio todas as nossas memórias naquela fumaça ao expirar, e já preciso fazer um certo esforço para sentir sua falta. Sinto que, aos poucos, minha rotina me fará acostumar à sua ausência. Mas qual é a pressa?

Ao passo que o pouco de café que restou esfria e que o que sobrou do cigarro está no cinzeiro, percebo que este é o momento certo para descer as escadas, e dirigir com os punhos firmes ao volante, até livrar-me de tudo isso.

Quando vejo que talvez eu tenha dado o primeiro passo, sussurro a mim mesmo:
- Apenas não me culpe.

Se ao menos nós fôssemos nada!




sábado, 4 de junho de 2016

111º Diário: Onde tudo começou.



Adicto.

Ao tentar fugir, encontrei um vício ainda mais grave em outra porta. E esta, com tanta indiferença me viciou até arrancar de mim qualquer traço de bom senso. Ela, de fato, não sabia que eu trocava todos os dias tudo o que tivesse ao meu alcance por ela. E é claro, fez com que a única coisa que me restasse nos bolsos ou no meu apartamento vazio fosse um segredo silencioso. Tal silêncio era capaz de aniquilar qualquer traço de ecos ensurdecedores que viessem a adentrar pelas frestas de minha porta.

Sete de abril.

Sob a guarda de uma árvore no meio de um inferno de pessoas correndo impulsivamente para todos os cantos, com faróis altos sobre nossos rostos, em uma noite recém caída, o excesso de palavras que guardava junto ao turbilhão de sentimentos que viviam a me ensurdecer efervesceram e transbordaram sutilmente pelos meus lábios, gota a gota, na tentativa de criar uma bela história entre nós dois. Afinal, eu era um adicto, mas ela não sabia. E quando caí em minha realidade, já era tarde: estava convulsionando em uma crise de abstinência, após uma semana sem poder trocar sequer uma moeda por mais uma fração deste poderoso ópio.

Já não havia mais silêncio ou segredo qualquer. Eu era um doente, viciado, morrediço, dentro de um apartamento vazio, relendo um velho bilhete guardado no bolso de meu único casaco que sobrou, o meu predileto. Tudo poderia resumir-se em "Você nunca vai entender". Era, talvez, a origem mal contada de um livro inteiro.

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"Quem sabe, eu morreria de vontade de ter uma overdose de você, mas você nunca vai entender. Ou talvez, eu tenho um ciúme devastador quando a vejo  dançando com a minha necessidade de provar mais alguns instantes, mas você nunca vai entender. Sim, eu sempre tive. Eu morria de ciúmes de você com o meu bom senso, mas você nunca vai entender."

E, após dois longos meses, passo a correr como um louco, um salteador, um pedinte, ou até mesmo um golpista, para poder arruinar um pouco mais de meu corpo com uma nova dose. E todas elas tem uma sensação diferente a me oferecer. Um novo sabor. Como se todas elas fossem um novo primeiro beijo. Em meio à fumaça de cada dose, sinto-me como se nunca houvesse provado tanta satisfação de uma só vez. Uma inundação de dopamina, taquicardia, tremores e suor em minhas mãos me fazem querer mais. E muito mais recebo em troca a sensação de que está acabando, de que tudo o que eu poderia provar a mais está virando pó entre meus dedos e dispersando-se ao vento. Como se não fosse o bastante, tenho a sensação de que ela não conhece o meu vício.

Alucinado como nunca, ouço a fumaça pedir para que eu não a deixe sozinha. Um breve esforço, mais uma dose. Você não faz ideia de que um dia tudo isso pode acabar.






sexta-feira, 20 de maio de 2016

Vertigem



"Não é assim que sempre começa?"

Uma melodia, uma memória, ou apenas uma fotografia. Algo enquanto fumava um cigarro na varanda, fez minha atenção sublimar por um instante, tal qual uma alma tentando provar que é mais forte que o próprio corpo. Havia uma história sem fim, caminhando a passos leves e desatentos pela calçada, de modo que já não sabia se poderia sonhar um pouco mais, envolto na névoa voraz que juntava-se à minha loucura ou correr em sua direção, mesmo admitindo a tolice de que nossas histórias já não eram as mesmas desde que fugi.

Talvez, em alguma das inúmeras partes das histórias de minha vida fantasiosa que te contei, diminuí alguns anos em verdades. Sei que, no fundo, você não me perdoaria e sequer estaria aqui, ao meu lado, neste sofá de madeira em minha sala, tomando café e com os olhos fitos aos meus. A sua obsessão por meus olhos talvez até afaste da tua atenção qualquer verdade a tona. Mas de que isso importa? A essa altura, tudo se foi.

Creio que já saiba que tão próximo àquela esquina vivia aquele grande amor, ao qual dediquei cada um dos três beijos para casar que dei em minha vida. Porém, jurei a mim mesmo que nunca saberia de nada disso, e assim o fiz. Afinal, é coisa da tua cabeça. Jurei que não a abandonaria, mas nos últimos instantes fui eu quem puxou o gatilho.

Mas poderíamos ao menos tentar reescrever alguns instantes de minha loucura, a fim de procrastinar o que já deveríamos ter feito há décadas. 

"Isto tornou-se uma equação vergonhosa!"

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Quando estava debruçado no canto do parapeito em minha varanda, a vi passar na calçada do outro lado da rua. Sonho em algum dia entender o que passou pela minha cabeça quando decidi correr pela porta, atravessar minha sala em direção a saída do apartamento. Gostaria de relembrar o que motivou tal suicídio escrito quando meus pés vislumbraram um degrau onde não mais existia e pisaram em falso. 

Tal qual um peso morto meu corpo rolou pelas escadas, em uma decadência sem fim. A cada estrondo de meu corpo na madeira dos degraus, eu jurava que conseguiria levantar-me, mas era tarde. Haveria em minha história uma marca que me destruiria caso algum infortúnio do destino me permitisse sobreviver a tanto: o peso da culpa.

Enquanto meu corpo rolava incessantemente, sabia que não haveria de receber uma gota de perdão sequer, pois tudo havia sido em vão. Minha pressa em encontrá-la, forçou-me a criar um pesadelo a ponto de cair degrau a degrau.

A cada passo que meu corpo insistia em dar tomando as honras de meus pés em um doloroso descontrole, pensava que tudo isso poderia ter sido evitado. Menos desonroso seria estar fazendo as vezes de um fugitivo, um cronista louco, um devasso, do que fantasiar-me em hematomas de uma pressa infundada, que necrosou minha liberdade de fugir. Porque afinal, tudo havia sido em vão.

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Quando cheguei ao térreo, percebi que fiz certo ao deixá-la ir. Digo isto de maneira suficientemente egocêntrica, a ponto de transparecer que cabia a mim a decisão de tê-la comigo. Porém, em meu ábaco não haviam pedras para tantas histórias de um forasteiro platônico a ser escritas, muito menos somadas. O que estaria acontecendo comigo? Um desejo interminável motivado pela abstinência que você me causou.

"Silêncio, silêncio. Acalme-se!"

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Quando cheguei ao térreo, levantei-me como se todos aqueles oitocentos e noventa e seis dias de queda fossem apenas um passo em falso em um desnível imperceptível. Levantei-me e, sem qualquer disfarce ou capricho, ajeitei o que vestia, e ao olhar para o rastro de sua passagem no lado de lá da calçada, apenas dei-me ao luxo de sussurrar: 

- "Você e que exército?"

Oh Céus, você tem que fazer isto parar!



sexta-feira, 4 de março de 2016

Ábaco



Deveria tornar-me louco a ponto de admitir, à base de um Whisky 12 anos escocês e um bom cigarro enquanto sentado na varanda, que estou torridamente apaixonado. Não daquele modo passível de subestimar-se, no qual apenas sonha em roubar um beijo e torná-lo eterno, pois seria deveras medíocre. Porém, por instantes hesito em dizer que poderia provar ser algo maior. Talvez pela necessidade de admitir que tão logo meus olhos a viram, percebi que experimentaria ao menos uma vez em minha vida o sofrimento de um platônico.

É terrivelmente obcecante a maneira com que seus olhos tentam contar alguma história sem fim aos meus. Poderia passar todos os meus dias de insônia tentando somar as inúmeras vezes com que eles se encontram,  na qual sorrio disfarçadamente sem desviá-los por um instante, apenas pelo prazer de vê-la sorrir sem entender o porquê.

Faço questão de silenciar qualquer barulho dentro de meus pensamentos para poder apreciar o som da sua voz, emoldurado pelo seu sorriso como uma obra valiosa. Creio que fugir para lá seria muito mais do que a mediocridade de uma paixão habitual. Seria talvez um refúgio, um recomeço como todos os outros, em meio a tantas novas vontades de mudar.

Porém, obviamente, nada passa de uma varanda, um whisky e um cigarro, observando um mundo a ser descoberto lá no térreo. Nada passa de um platônico, observando todo o movimento abaixo de seus pés, cogitando estar esperando de malas prontas a próxima fuga.


terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Beautiful Legs, Umbrella.



Foram quinze minutos de loucura.

Quando vi a fumaça ao meu redor, pensei que estava na hora de deixá-la ir para sempre. Tentei esquecer o seu aniversário, o brilho dos seus olhos, os nossos planos e todas as nossas histórias. Em pouquíssimos instantes, tudo ao meu redor me levou a crer que era hora de partir. E o fiz.

Disfarcei em um amor travestido de perfeito a falta que ela me fez e a vontade de voltar atrás. Era tarde. Não éramos mais sequer amigos de verdade. Eu fugi. Afinal, é perigoso assumir um amor cercado de barreiras quando se é tão fraco! E assim o fiz tantas vezes, com tantos outros planos.

Tudo foi em vão.

A essas alturas, estaria bem se não soubesse o seu nome. Mas, já que a encontrei solitária pelas ruas nesta tarde chuvosa, não seria má ideia convidá-la a fugir, a se confundir com minhas palavras sem nexo, e implorar para que me perdoasse por tê-la abandonado. E então, saberia o verdadeiro motivo de eu nunca tê-la amado como merecia: Eu apenas queria que ela fosse feliz.