quinta-feira, 26 de junho de 2014

Short Memories - XVIII




Estou me sentindo estranho. Sempre estive, mas nunca percebi realmente. Já sentiu cheiro de nostalgia? Não sei explicar como é. Mas é um perfume que eu não estou sentindo de verdade ou respirando. Na verdade, não sei explicar! Não é como aquele cheiro de hospital que o toma às vezes. A sensação é nostálgica. A sensação me mata um pouco e aos poucos. Mas ela é boa! Quem me entende? Tem quem suspeite, e diga que entende. Mas rapaz, ninguém entende de verdade. Tampouco eu! Quem nos entende? Talvez seja muito fácil nos entender. Tão fácil que ninguém pensou em usar a forma correta. Quando o leio, fico meio com receio das minhas conversas. Céus, eu sou um lunático! Não lembro quando comecei com isso. Em uma noite qualquer, chuvosa como essa, com perfume de adeus com nostalgia. Mas no final das contas, a gente sabe que não vai acabar.

(Short Memories, Gabriel Derlan)


terça-feira, 17 de junho de 2014

Devaneios, Entrelinhas (Short Memories - XVII)



"Está pronto. Ao terminar o disco, ouço tudo novamente em busca de tropeços, enquanto meu corpo não chega à beira mar. E fujo todos os dias para lá, e releio doze vezes a mesma história. É um destino traçado que muda todos os dias, e me faz voltar à tona. O inverno voltando é um perfume de qualquer coisa épica que se repete ano após ano, na janela de meu quarto aberta. É cheiro de rua, de fuga, de amor mal escrito. É fraqueza, tremor, síncope. São mil e um parágrafos de devaneios mimetizados por um sorriso, um tapa, um adeus, um piscar de olhos. Subir em uma escada de vitrine, e sentir-se gigantesco. Jogar os cabelos em trevas ao lado, em chamas, em um olhar. Inseguro não segura, e seguro se faz livre. E livre se ama muito mais. Uma história velha reescrita, em menos de dez cartas à pessoa amada. Tão baixo, vil. Um coração batendo desigual. Mais de dezesseis mil dias na tentativa de fazer valer a pena. De fazer valer um dia. Uma simples corrida, a fim de merecer a volta pra casa. Um dia tudo sai dos trilhos, eu prometo."

(Short Memories, Gabriel Derlan)




quinta-feira, 5 de junho de 2014

Taciturno



Subindo os quarenta e quatro andares com o almoço nas mãos. Não gosto muito de usar o elevador. As escadarias dão um pouco de vida à minha imaginação (estar solitário também traz boas ideias à memória). Esperava encontrar-me com outra coisa, mas tudo o que trago nas mãos é uma xícara de café. Este por sorte é um vício que eu influencio aos meus fantasmas mas que não abandono. É bom recusar o exemplo de muitos outros que me deram vida. Fiz com que tornassem adictos de tantas coisas, para depois eu perceber que tudo aquilo era deveras passageiro.

Taciturno. Foi assim que me chamou. Lembro-me daquele almoço como de qualquer outro: sentados à mesa como amigos, ou algo pior. Eu era apenas algo alheio, por não comparecer às suas festas, brincadeiras, costumes, vidas. Por falta de convite, talvez. Quem sabe, fosse por eu preferir subir as escadas. Mas as escadas são um esforço desnecessário para eles, algo que só um perfeito imbecil faria. A partir do momento em que tornei-me inútil, sem serventia alguma, aqui estou: subindo meus quarenta e quatro andares tal qual um taciturno, pensativo, e com minha xícara de café.

Parece relativamente fácil caminhar degrau a degrau. Mas quando passo do quarto piso, as escadarias tornam-se sombrias. Poderia detestar estas lâmpadas queimadas ou essas teias de aranha, mas não acredito que seria pior do que uma dose de cianureto na vida. Não mandaria prendê-la no amanhecer, mas não correria novamente. Não seria alvo de uma mentira mal feita. Quem sabe, uma propaganda mal feita?! Tudo ficou nessa situação porque ninguém quis dar-se ao esforço de continuar pelas escadas depois deste piso, nem mesmo os que recebem fortunas para zelar por tudo isso aqui. Pelo menos em um incêndio não estarei sozinho aqui: Eles vão precisar utilizar as escadas!

Qual será a chance, então, de queimá-la?

Vivendo em um mundo só meu, tentando levar-me para casa. Apenas um só. E só. Ouvir aquela voz me traz boas lembranças. Lembrar daquela voz em minha memória me deixa dopado por um instante, ou dois. Olhar para os degraus abaixo me dá uma séria vontade de descer e pegar outra xícara de café.