sábado, 9 de dezembro de 2017

Starting Over



"Olhava em volta e tentava entender: Oh céus, como cheguei aqui?"

Na tentativa de resgatá-la, ainda que incrédulo, voltei no tempo. Percebi que, sabendo meu foco, seria fácil encontrá-la. Ledo engano.

Precisei de muito para descobrir que na noite em que eu estava à sua procura não tinha sequer algo penhorável para viajar até ela. Era mais um dos infinitos ensaios de minha juventude, no qual pela primeira vez havia fugido de carona ao outro lado da cidade para encontrar alguém que há séculos sonhara.

Este foi meu primeiro obstáculo: na noite em que dava a mim mesmo a missão de salvá-la, precisaria destruir o sonho de encontrar um grande amor. No entanto, já estava confuso se a decisão que eu acabara de tomar por sua vez havia refletido no futuro do qual eu vim. Isso porque dentro de mim já havia uma cisão catastrófica, da qual recordava com clareza: Aquele amor havia acabado justamente por eu tê-la abandonado em algum momento, sabe lá Deus qual!

Saio em disparada à beira da estrada e deixo todos os que esperavam por mim para trás. Afinal, estava determinado a encontrá-la a tempo de adverti-la e, quem sabe, dizer que a amava. Descobri que, pela primeira vez, estava correndo atrás de algo que realmente faria a diferença em minha história.

Agarro-me em cada trem que, sabia, me levariam até lá. A cada vez que me soltava, ora por perder a força, ora por ser descoberto em minha jornada, amontoava-me à beira dos trilhos e continuava a pé, até passar o próximo trem.

Perdi a conta dos dias que levei para encontrá-la. Talvez meses. Em alguns lapsos de tempo chegava a esquecer que havia voltado no tempo para estar ali. Quando me dava conta, pensava ser um sonho. Olhava para as minhas roupas sujas e não sentia mais a vontade de voltar para casa. Meu corpo que já não era digno de livre acesso a qualquer lugar que não fosse um albergue ou afim, ao menos estava jovem. E que alegria tinha em saber que havia conseguido utilizar ao máximo a energia de minha juventude! Ora, lembrava-me que se estava ali, era para fazer valer a pena.

Depois de abandonar um encontro em uma noite e vagar quase sem rumo por meses, longe de qualquer um que pudesse me acolher, a encontro na noite em que poderia mudar toda a sua história - e quem sabe, a nossa?

Lá estava ela, do outro lado da rua. Talvez pudesse fingir que não sabia o seu nome, mas libertá-la de seu futuro era importante demais para apegar-me em detalhes. Via em seu olhar que a fuga que a levara até ali não era para somente aproveitar a noite. Quem sabe isso pudesse acontecer, mas os seus olhos denunciavam que estar feliz ali estava em segundo plano. 

Tive vontade de gritar "que diabos está fazendo, garota?!", mas antes que formasse a frase toda em meus lábios desesperados, tive o prazer de ter seus olhos vazios voltados para mim.

Na esperança de que ela me conhecesse, comecei a caminhar em sua direção através das pessoas na calçada. Atravesso a rua que nos separava e percebo que, como se não houvesse nada que pudesse impedir, ela acena ao táxi que ali passava. Interrompo meus passos e olho para mim. Como um já esmoleiro seria capaz de mudar a sua história?

Paro a beira do meio fio e acompanho seu embarque não tão longe, na esperança de encorajar-me a contá-la o que eu já sabia. Porém, pedinte que era não teria qualquer fé diante do luxo que a cercava. Seria apenas mais um lunático.

Acompanho com certo pesar o veículo partindo e pela primeira vez sinto um aperto por ter visto de perto a história que um dia caberia a nos afastar.

Em instantes trago à memória a maneira como os nossos olhares se cruzariam no futuro outra vez, como se já soubéssemos tê-lo feito antes. Porém, agora sabendo que não havia como mudar o nosso passado funesto, cabia a nós dois tentarmos uma maneira de fugir do que o futuro nos reservaria.

Uma forte dor em minha cabeça me faz acordar no sofá de meu apartamento. Agora, pois, procurava provar a mim mesmo que toda a história que acabara de viver não havia sido mais um mero devaneio.