segunda-feira, 25 de novembro de 2013

One Step Closer (Annie, uma História e um Café - IV)

Leia: Annie, uma História e um Café - I, II e III.
"Annie segura em minha mão, quando todo aquele movimento chega até nós. Sinto-me em um mar de humanos, com toda aquela onda correndo em minha direção. Mas de repente tudo para ao meu redor. O tempo, as pessoas, o tumulto. Aquela dama a quem observava cruza o seu olhar com o meu, e parece saber exatamente o que eu estou pensando."



Quanto vale um passo? Contei cento e setenta e oito até agora. Até chegar na plataforma do trem das cinco da tarde. Um rosto desconhecido viria ao meu encontro. O que eu faria? Testei o meu apego há meses, e vi que funciona de forma excelente. Annie estava com uma paz descomunal. Tenho certeza de que o maior ansioso ali era eu.

Comecei a viver então uma sensação estranha. Era incomum. Minha cabeça remeteu-se ao passado, como em um livro. Lembrei-me do dia em que encontrei aquela menina sob a árvore, que não dizia uma palavra sequer. Das loucuras que fiz para que conseguisse estar ali. Tudo recompensado por um telefonema, pelo qual finalmente ouço aquela doce voz. O que estaria por vir ao meu encontro de fato, era mágico.

No dia em que encontrei Sophie com a ajuda de Vivian, não pude conversar por muitos minutos. Foi algo suficiente para marcar o dia e a hora de um encontro que teria tudo para ser inesquecível. Não havia tanta fé na voz daquela dama. Por um momento, imaginei que seria a semana mais longa que eu viveria até conseguir encontra-la pessoalmente.

A espera se fez terrivelmente lenta, como qualquer espera por alguma recompensa. Mas estávamos ali, finalmente, naquela gigante estação de Trem. Disse a Annie que não daria um adeus sequer, para ter certeza de que estaria por perto. Pedi um abraço, para lembrar pra sempre de tudo o que aprendi com ela, e coloquei em seu pescoço um colar com pingente de águia para, quem sabe, ela continuar a alçar voos altos.

Partiríamos para novas vidas, novas rotinas. Viveríamos novos sonhos, novas músicas, novos livros. Sim, tudo outra vez. Quem sabe encontraríamos novas aventuras, caso esta loucura não tivesse sido a maior das nossas vidas até então.

Chega o tão esperado momento: O trem para na estação, e quase os humanos do mundo inteiro saem dele. Tinha dito a ela que esperaria em meio ao saguão, próximo ao portão de embarque. Teria ela conseguido vir até ali? Meu coração estava a ponto de abrir um rombo em meu peito, tão forte batia!

Vejo então um rosto diferente saindo no meio daquele tumulto. Realmente, aquela atitude era completamente diferente de todos os outros. Enquanto todos caminhavam determinados, sabendo a que estava fadada a própria vida, ela estava com uma postura de quem estava procurando a sua vida em meio à multidão. Não com a pressa de quem junta a palha com uma pá em um galpão, mas com o cuidado de quem está procurando um alfinete ali em meio.

Annie segura em minha mão, quando todo aquele movimento chega até nós. Sinto-me em um mar de humanos, com toda aquela onda correndo em minha direção. Mas de repente tudo para ao meu redor. O tempo, as pessoas, o tumulto. Aquela dama a quem observava cruza o seu olhar com o meu, e parece saber exatamente o que eu estou pensando. Era ela: Sophie Fester, que observa o pequeno anjo que estava preso à minha mão. Ela então começa a caminhar a passos apertados, em uma corrida regada por um sorriso, lágrimas e euforia, recompensada por um abraço apertado.

Não poderia expressar em um milhão de palavras tudo o que vi. Tive a impressão de ter vivido ao menos treze vidas antes de chegar até ali. Ver elas se reconhecerem mesmo tendo estado distante há uma vida toda, foi inexplicável. Ambas se abraçam, e eu simplesmente fecho os olhos. Não sei que tipo de sensação me tomou naquele momento. Foi como se eu não estivesse ali. Como aquele sonho distante, aquela vontade de pisar fundo no acelerador em uma reta sem fim, ou então a sensação de estar pulando do quadragésimo andar. Quem sabe, tudo ao mesmo tempo!

Após abraçar Annie, Sophie veio em minha direção. Abracei-a por quase um minuto, enquanto ela chorava aos soluços. Vi a felicidade em seus olhos, e o seu desespero em abraçar Annie, e tentar viver o que nove anos impediram. Não era tempo para histórias, muito menos para despedidas. Aquele rio estava correndo, e toda aquela dor da distância de alguém que amou de verdade estava terminada.

Não quis que aquilo se tornasse outro adeus, ou uma despedida qualquer. Antes, preferi contemplar o último olhar que fosse possível, antes de sorrir em paz, baixar os olhos, balançar levemente a cabeça em tom de “sim”, e partir. Sim, eu parti. Caminhei alguns passos, e voltei a olhar para trás: elas estavam caminhando no sentido oposto. Voltei a andar, em direção ao fim da estação.

Não senti remorso como das outras vezes que parti sem dizer adeus. Sabia que por onde elas estivessem agora, estariam perto de mim. Não fisicamente, claro. Mas já carregava dentro de mim aquele apego pelo qual vivi os últimos dias. Aquele pedaço de vida, que dediquei a alguém que me pagou com um presente caríssimo: um abraço apertado e um sorriso sincero.

Você nunca saberá o destino delas, quem sabe. Talvez, muito menos eu. Sinto aquela leveza estranha ao embarcar sozinho em meu carro, depois de tantos dias. Dou a partida, e saio sem rumo mais uma vez. O que seria capaz de me encontrar agora?

The end, maybe.