quarta-feira, 14 de maio de 2014

Café (Short Memories - XVI)



Nada como voltar no tempo, através de velhas cartas. Pode demorar uma eternidade para tudo ficar pronto, é claro. Esse café demorou mais de um ano para ficar palatável! E hoje a mesa está farta. Sentimentos e lembranças boas à mesa. Grama verde, livros grandes de geografia e história e um apetitoso pão de batata. Faz sentido apenas para quem sente. 

Nada como voltar no tempo através daquele perfume. Algo como curiosa, intrigante, ou secreta. Embriaguez ou entorpecência qualquer me faria sentir tão bem quanto me senti naquele abraço, naquela lembrança, que não escrevi sozinho.

Nada é qualquer. O perfume, a avenida, aquele abraço, aquele sonho, o aperto mortal, o pão de batata - pra que tanto insistir? - o café quente, forte e com pouco açúcar. Sequer o lugar foi qualquer. Longe, no passado ou no futuro. Todos já sabiam no que um devaneio desses poderia resultar. Não importa.

Nada como saber que não estou só, e que quem me dá o prazer de sua presença também veio para o café. Não andamos mais de bicicleta atrás de pessoas perdidas, ou a pé após musicalizarmos uma vida em preto e branco com compositores que sequer imaginamos conhecer, ou escondidos de todos para fugir de nossos fantasmas. Mas conseguimos voltar ao passado, e hoje isso é o que mais importa.

(Short Memories, Gabriel Derlan)